# OFF-STAGE # 7 - Amizade não é trabalho
Entre concertos, encontros e desabafos, percebi por que só faço amigos no trabalho.
Numa sessão de terapia com a minha terapeuta, questionei porque não consigo fazer amizades fora do ambiente de trabalho. A pergunta pairou no ar enquanto ela, como é habitual nos psicólogos, devolveu-me questionamento. Odeio quando fazem isso, principalmente, porque tenho de contar as minhas merdas/inseguranças e ainda tenho de pagar. Afinal, quem é que paga para contar segredos?
Como mencionei no episódio 6, estive presente no Festival Coala através da HAUSDOWN, a agência criativa da Ana Rita da qual me tornei sócio. Para quem não a conheça, a Ana Rita D'Almeida é uma jovem portuguesa de origem cabo-verdiana que há 3 anos recrutei para desenvolver projetos na BANTUMEN. Acabei por ocupar metade do tempo que ela tem na vida e hoje é uma das minhas melhores amigas. Adoro o seu profissionalismo e a sua forma ardilosa de pensar, características que fazem dela uma parceira de negócios inestimável.
O concerto de 23 de maio com o Phedilson foi um sucesso no aspeto emocional. Organizar o primeiro concerto dele fora de Angola foi especial, até pelo tempo que trabalho com ele, mas confesso: na vida real nunca mais quero organizar nada, nem sequer aniversários. A logística e a pressão são demasiado para o meu gosto.
Voltando à minha presença no Festival Coala (e quando digo "presença", falo como se fosse atuar), no dia 25 estive com a Rita e fomos à apresentação do festival no Rooftop (IDB) de Moscavide. O espaço não impressionou muito o pessoal, mas tinha uma roda de samba animada e muitos brasileiros e brasileiras a dar vida ao ambiente. Mal chegámos, encontrámos logo a Marta e a Boss do festival, que olhou para a minha cara e disparou sem rodeios: "Desculpa, mas já não tenho mais dinheiro".
Para contextualizar esta situação: há cerca de 1 ano, o Kalaf Epalanga fez a ponte para uma reunião entre a HAUSDOWN e os organizadores do festival, com o objetivo de direcionarmos a comunicação às comunidades PALOP. Marcámos uma reunião via Google Meets e o pedido deles, feito a poucas semanas do evento, foi interpretado por nós como: "Fizeram um festival com line-up PALOP, curadoria do Kalaf, mas esqueceram-se de comunicar às comunidades africanas". Aceitámos o desafio, desde que os valores incluíssem uma taxa de urgência e respeito pelos "esquecidos".
Como era de esperar, já não tinham orçamento disponível. Mesmo assim, avançámos com a promessa de que na segunda edição receberíamos o valor justo pelo nosso trabalho. E como acontece frequentemente nestas situações, saí daquela reunião rotulado como o intolerante. Um ano depois, eis que surgiu a necessidade da verbalização da frase: "Desculpa, mas não tenho mais dinheiro".
No evento, além da comunidade brasileira, estava também a Inês Borges, outra grande amiga e parceira de negócios. Ela é das melhores designers que Portugal já teve e será responsável por desenvolver toda a imagem da comunicação do MIA. Também estava presente a Maira, que segundo ela própria, foi colega da minha filha mais velha, Ana Carolina.
A Maira tem 25 anos e trabalha diretamente com influenciadores e artistas, uma área em franco crescimento na HAUSDOWN. Enquanto a Rita - com a sua Pós-graduação em Strategic Marketing pela ESEI International Business School Barcelona, está mais focada no setor corporativo - ter alguém como a Maira, que sabe lidar com pessoas é exatamente a cereja em cima do bolo que precisamos para completar a nossa equipa.
No ano passado, faturámos cerca de 60.000 euros, mas estou convencido de que deixámos escapar outros 100.000 por falta de experiência nesta área específica. É precisamente por isso que alguém com o perfil da Maira seria uma mais-valia para nós.
Divaguei um pouco... desculpem, já retomo o fio à meada. Atualmente, a Maira trabalha com a umafricana, que é DJ, autora e influenciadora. Aproveitei a sua presença como manager para desabafar sobre algo que me incomoda: a umafricana é uma miúda que sempre foi muito acarinhada na BANTUMEN, já a convidámos para colaborar connosco, eu pessoalmente já a entrevistei, mas o comportamento dela é desconcertante. Quando nos cruzamos na rua e a cumprimento, ela simplesmente ignora-me. É tão estranho que cheguei a questionar-me: "Será que alguma vez, num momento de inconsciência (e eu nem sequer consumo álcool), fiz algo inapropriado com esta miúda?"
Aproveitei a presença da Maira para expressar o que me incomodava. Segundo ela, a umafricana é muito tímida, o que explica porque quando alguém a cumprimenta (neste caso, eu), ela simplesmente não responde. Curiosamente, o Wilds já se tinha queixado do mesmo comportamento.
A Maira foi buscar a umafricana e a Alice , uma das back vocals do Dino D'Santiago, e apresentou-nos como se fosse a primeira vez que nos víamos. Mesmo com esta reintrodução formal, senti-me como Joe Goldberg, a personagem da série da Netflix interpretado por Penn Badgley, quando conhece Bronte (papel de Madeline Brewer) na última temporada: "Porque não vens amordaçar-me?". A sensação de estranheza persistiu.
Depois de algumas Coca-Colas Zero, fizemos uma saída à francesa. A semana continuou o seu curso normal e, entretanto, tive uma conversa muito produtiva com o Vui Vui (OG Vuino), que esteve de passagem por Lisboa. Também marquei presença na apresentação do álbum "Dinastia" da Chong Kwong, outro evento importante no panorama cultural.
Na sexta-feira, 30, fomos à Rádio Oxigénio a convite do DJ Kwan. Levei comigo o Phedilson e o Wilds para falarmos sobre os 10 anos da BANTUMEN e todos os eventos que organizámos desde janeiro até maio. Depois da entrevista, dirigimo-nos ao Bairro Alto, à Casa do Comum, onde decorreu a talk BANTUMEN & Santolafiado, uma espécie de pré-evento para o especial "BANTUMEN 10 anos com São Tomé e Príncipe". O Wilds moderou uma conversa fascinante com a estilista Roslyn Silva e o rapper Pekagboom (conhecido como "o mais polémico"). A conversa aconteceu na sala da livraria, para a qual reservámos 30 lugares. Apareceram cerca de 25 pessoas, e o percurso profissional dos três intervenientes e a sua ligação com São Tomé foi o tema central da discussão.
No sábado, o dia começou com um telefonema do Wilds. A Hausdown tinha acabado de fechar mais um contrato publicitário com a marca Avantim, também presente no Festival Coala, e ele precisava da máquina Sony A7IV para filmar. No entanto, percebeu rapidamente que toda a logística de deslocação da baixa de Lisboa até à sua zona iria consumir demasiado tempo, por isso avançou com as filmagens utilizando a Sony ZV10. O resultado final ficou impecável, como podem verificar no link que partilhei.
A nossa colaboração com o Festival baseia-se no marketing de influência. Para quem não está familiarizado com o conceito, trata-se de uma estratégia em que marcas ou empresas (neste caso, o Festival Coala) estabelecem parcerias com pessoas que têm uma presença significativa nas redes sociais – Instagram, YouTube, TikTok, entre outras – para promoverem os seus produtos ou serviços. A Maira gere vários destes influenciadores e artistas que a Hausdown convidou para fazerem parte do nosso projeto. São 20 no total, dos quais 3 são remunerados, além do Wilds, que assume o papel de repórter digital do Festival.
A eficácia desta estratégia reside no facto de os influenciadores já terem conquistado a confiança do seu público. Quando recomendam um produto ou serviço, é como se estivessem a partilhar uma dica com um amigo, tornando a publicidade mais autêntica e próxima. E é precisamente por este serviço que somos pagos, sendo este o ponto de partida do nosso trabalho.
A nossa equipa no festival é composta por talentos diversos: a Inês Borges, designer que colabora com a BANTUMEN, a Hausdown e em projetos pessoais meus relacionados com música; a Eliana Silva, antiga colega do Sapo Internacional há 15 anos, que agora trabalha com a Hausdown e é fundadora do site "Marcas por Escrever" (parte da rede BANTUMEN), além de ser minha comadre – sou padrinho do filho dela, o Luca.
Neste fim de semana, o meu grande objetivo é convencer a Maira a juntar-se à nossa equipa. É ainda cedo para saber se vou conseguir, mas estou a empenhar-me ao máximo para que ela reconheça as vantagens de integrar o meu círculo de amigos e colaboradores.
Gostaria de partilhar mais detalhes sobre o festival, mas esta newsletter foca-se nos bastidores da BANTUMEN e não da Hausdown. Durante estes dois dias, refleti bastante sobre como alguém que sofre de transtorno de ansiedade social (fobia social) consegue lidar com a presença em eventos massivos como este festival, rodeado por milhares de pessoas.
E assim, voltando à pergunta inicial da minha terapeuta, compreendo agora que o que torna difícil para mim interagir com pessoas fora do ambiente de trabalho é precisamente a ausência da estrutura que o contexto profissional proporciona. No trabalho, as relações desenvolvem-se naturalmente, com objetivos comuns e uma rotina estabelecida. Fora desse ambiente, a ansiedade aumenta, sinto-me mais exposto e receio ser julgado. Tenho a sorte de ter a minha companheira como melhor amiga, o que acaba por ser o meu refúgio e diminui a necessidade de me forçar a criar outras ligações, mesmo quando, por vezes, sinto falta desse tipo de conexão.
No próximo episódio, vou apresentar-vos a história da Joana Alcântara, a jovem responsável pela agenda cultural, cujo percurso promete ser tão interessante quanto revelador do funcionamento dos bastidores da indústria cultural.